quinta-feira, 15 de março de 2012

Governo vai ampliar acessibilidade para a Rio+20


A acessibilidade em todas as áreas da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, é uma preocupação do governo federal, compartilhada pelos governos do estado e do município do Rio, disse o secretário nacional do Comitê Nacional de Organização da Rio+20, Laudemar Aguiar. A conferência da ONU ocorrerá em junho próximo, na capital fluminense.
A meta é tornar a Rio+20 o mais acessível possível. "Porque, se a ideia da presidente Dilma Rousseff e das Nações Unidas é que a conferência seja participativa e inclusiva, você não pode excluir cerca de 40 milhões de brasileiros que têm algum tipo de deficiência", disse Aguiar.

Ele explicou que o trabalho de garantir acessibilidade é voltado para a conferência em si e para a cidade do Rio. A iniciativa tem duas vertentes e abrange tanto as pessoas credenciadas para a agenda oficial, quanto as que não estão credenciadas, mas poderão participar dos eventos paralelos que serão realizados em áreas da Barra da Tijuca, no Parque do Flamengo, no Píer Mauá e na Quinta da Boa Vista.

A primeira vertente diz respeito aos equipamentos físicos e digitais. "Nós estamos criando um novo patamar de acessibilidade para as conferências da ONU na Rio+20", garantiu o secretário. Ele está consciente de que não há tempo hábil nem meios para fazer com que a conferência e a cidade sejam totalmente acessíveis. "Mas a ideia é criar um caminho".

A segunda vertente consiste em garantir acessibilidade na própria organização do evento. Para isso, estão sendo contratadas pessoas com deficiência para assessorar os organizadores, de maneira que o trabalho seja feito da forma correta. "E contratar pessoas com deficiência também para mostrar que elas podem produzir e contribuir".

O secretário acredita que em pouco tempo a acessibilidade será compreendida pela população em geral e fará parte do dia a dia das pessoas. "Significa cumprir o que é regulado por lei no Brasil", disse o coordenador de Relações com a Sociedade Civil da Rio+20, João André Rocha. Ele destacou que a acessibilidade é um dos pilares do desenvolvimento sustentável.

Além do trabalho para criar acessibilidade física, há preocupação em relação à acessibilidade de conteúdo nos documentos oficiais da conferência, como recursos em braille (sistema de leitura para cegos), em closed caption (legenda oculta) e em audiodescrição (solução de acessibilidade destinada a pessoas com deficiência visual, podendo ser realizada ao vivo ou gravada), por exemplo. "Isso tem sido um desafio para o comitê, porque embora a acessibilidade no Brasil seja assegurada por lei, não é no bojo da conferência que a gente vai conseguir transformar tudo em acessível", ressaltou Rocha.

Laudemar Aguiar lembrou que o metrô do Rio tem piso tátil e é o único do País cem por cento acessível. "É uma vantagem que temos". Ele disse que a acessibilidade deve ser vista também como um fator de mobilidade urbana inclusiva. Mães com carrinhos de bebês ou pessoas idosas vão se beneficiar das melhorias que forem feitas para portadores de deficiência, acrescentou.

"A nossa preocupação é essa. É uma campanha educativa e, ao mesmo tempo, trata-se de dotar a cidade e a conferência de mecanismos mais acessíveis". O secretário espera que a Rio+20 seja um marco em termos de acessibilidade para as pessoas que vão participar da conferência. Ele quer que as pessoas percebam que atender aos portadores de deficiências não é um trabalho a mais. "É você beneficiar toda a população, é conseguir despertar nova consciência sobre a questão da acessibilidade".

No entorno do Riocentro, onde serão realizadas as reuniões dos chefes de Estado, as obras de infraestrutura necessárias à acessibilidade só deverão estar prontas para as Olimpíadas de 2016. Para minimizar, contudo, as dificuldades de acesso de pessoas com deficiência, o comitê organizador está pensando em contratar uma companhia de táxis especializada no transporte de deficientes e ônibus com elevador, além de providenciar a adaptação de banheiros nos locais onde ocorrerão a agenda oficial da conferência e os eventos paralelos.
(Agência Brasil)

terça-feira, 13 de março de 2012

Governo brasileiro e ONU diluíram agenda da Rio+20

Para ex-ministro, ausência de metas vem do receio de expor as contradições acerca das questões ambientais.
O governo brasileiro é atrasado em matéria de economia verde e, por isso, tem sido cúmplice das Nações Unidas na diluição da agenda da conferência Rio+20. Quem acusa é o embaixador e ex-ministro do Meio Ambiente (1993-1994) Rubens Ricupero.
Um dos principais negociadores brasileiros na Rio-92, Ricupero, coordena um grupo de políticos, intelectuais e cientistas que deve encaminhar ao governo um documento que critica as baixas ambições do País nessa área, especialmente em comparação com China e Coreia, e pede a criação de um ministério da economia verde. Em entrevista, ele manifesta o temor de esvaziamento da Rio+20. "Se você faz uma agenda modesta, está dando argumentos para que o pessoal não venha."
Folha - O governo tem dito que a Rio+20 não pode ser comparada à Eco-92. Isso é medo de criar expectativa demais?
Rubens Ricupero - É receio de desapontamento e expressão das contradições que existem no governo em matéria de definições ambientais. Como o governo é pouco claro nisso, procura acentuar mais temas econômicos e sociais. Você nota isso no desejo de inserir a Bolsa Família como um dos êxitos brasileiros na luta contra a desigualdade, que estaria em um dos três pilares da conferência. Não deixa de ser verdade, mas é preciso levar em conta que, no desenvolvimento sustentável, dois pilares, o econômico e o social, são definidos em função do ambiental. A Bolsa Família é meritória, mas não tem muito a ver com ambiente. De outro lado, há o receio de não conseguir repetir aquele êxito extraordinário. Em 1992, a conferência começou com a assinatura de duas convenções-quadro da ONU, a de mudanças climáticas e a de biodiversidade, coisas que você não pode repetir toda hora. Não me surpreenderia saber que muitos chefes de Estado talvez não venham.
Mas o próprio desenho modesto da agenda da conferência não torna a Rio+20 à prova de fracasso, e portanto atrativa para os chefes de Estado?
Se você tem medo de que não dê certo e por isso começa a diminuir a expectativa e faz uma agenda modesta, está dando argumentos para que o pessoal não venha. É difícil que essas figuras que estão batalhando com a crise do euro venham se a conferência for só uma declaração. Talvez esse formato de reunião já condene a um anticlímax. Uma comemoração nunca é a mesma coisa, é uma evocação, não uma repetição do fato.
Então não havia como a agenda da conferência ser mais ambiciosa do que ela é?
Você poderia fazer uma coisa honesta. Admitir que a conferência talvez não conseguisse resolver todos os problemas, mas dizer: nós não vamos varrer para debaixo do tapete os problemas que nos ameaçam, que são a questão climática e a do ritmo acelerado de extinção da biodiversidade. Uma maneira de fazer isso foi aventada pelo ex-senador americano Tim Wirth [que era subsecretário de Estado dos EUA na Eco-92].
A ideia era adiar a Rio+20 para o fim do ano, e que ela fosse antecedida pela Convenção do Clima e a da Biodiversidade. O pessoal ficou apavorado (risos). Com medo de que elas dessem em nada. Nos documentos que o Pnuma [Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente] preparou para uma reunião há duas semanas, havia um sobre como medir avanço ou retrocesso em tudo: camada de ozônio, tóxicos, aquecimento, extinção. Isso permitiria saber para onde as coisas estão indo.
Indicadores de desenvolvimento sustentável.
É. Se tivesse havido coragem, poderiam ter preparado uma reunião que não escamoteasse a gravidade dos problemas. O que se está procurando fazer, e não somos só nós - a conferência é da ONU - é disfarçar isso.
Como isso se manifesta?
Uma das formas é a diluição da agenda. O governo brasileiro diz uma coisa que é difícil de criticar em si: que o desenvolvimento sustentável tem três pilares, o ambiental, o econômico e o social. Mas a forma como isso está se traduzindo é que tudo entra na agenda, até a reforma do sistema financeiro. O problema ambiental, que na verdade é a razão principal, acaba sendo um entre 678.
Houve sequestro da agenda da conferência pela agenda do governo brasileiro?
Não. A ONU baixou o nível de expectativa. O Brasil só se aproveitou disso. O governo é atrasado no tema de economia verde, a maioria das pessoas nem compreende esse conceito, há contradições. O maior exemplo é o Código Florestal. Estamos na véspera da conferência com esse pessoal ruralista querendo votar uma coisa que é a negação da conferência. Como o governo tem essas contradições, a saída é diluir.
A ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) disse que ninguém tem mais credenciais verdes do que o Brasil.
Isso é em parte verdade, por causa do etanol, das hidrelétricas. Mas tem outro lado. Estão fazendo mais termelétricas. O governo nunca conseguiu fazer um plano de transição para uma economia de baixo carbono. A única medida de política econômica que eu conheço que o Brasil tomou nos últimos anos com um conteúdo ambiental foi o favorecimento a produtos de linha branca [eletrodomésticos] que economizavam energia. O que você não tem é um projeto de país, de governo, em direção à economia verde, como a China está fazendo, com investimentos pesados em inovação. No dia em que eles tornarem a energia solar competitiva, vamos ter de comprar deles, porque eles estão investindo, nós não.
Por que não?
Falta um lugar onde se possa pensar essa política, porque isso não é uma política do Ministério do Meio Ambiente. Você precisa integrar o conceito de baixo carbono no planejamento econômico. Mas você tem planejamento econômico no Brasil onde?
(Folha de São Paulo)

Brasileiros desconhecem a Rio+20. Por quê?


Artigo de Paulo Itacarambi, vice-presidente do Instituto Ethos, publicado no Correio Braziliense de hoje (13).
Pesquisa realizada neste início de ano por uma parceria entre a empresa Market Analysis e a ONG Vitae Civilis mostrou que apenas 11,5% dos brasileiros têm alguma informação a respeito da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, que vai ocorrer no Rio entre os dias 14 e 22 de junho deste ano.
A pesquisa foi realizada por telefone, em nove capitais, com 806 pessoas de 18 a 69 anos de idade. Dos entrevistados, 4% pertencem à classe A, 29% à B, 49% à C e 18% às classes D e E. Entre todos, apenas 4,4% ouviram "muito" sobre a Rio+20, enquanto 7,1% disseram ter ouvido "alguma coisa". Dos 11,5% que conhecem a Rio+20, 73% se interessam pelos assuntos relacionados ao evento. Os mais mencionados foram desenvolvimento sustentável, economia verde, combate à violência, combate ao tráfico de drogas, Copa de 2014, erradicação da pobreza, meio ambiente (geral) e combate à poluição.
O Rio de Janeiro, onde será realizada a conferência, é a cidade do País em que a população tem mais conhecimento a respeito: 24%. Por que tão pouca gente está interessada na Rio+20?
Na minha opinião, as discussões ocorridas até agora têm focado apenas nas negociações, sem se preocupar em esclarecer a sociedade sobre as mudanças que o evento poderá trazer ao mercado e à vida das pessoas. A mídia também passa ao largo do debate e não provoca os órgãos e entidades envolvidos a dar esses esclarecimentos para, com isso, aumentar o interesse da população e, em consequência, a relevância da conferência para os diversos segmentos da sociedade.
Quais podem ser os impactos da Rio+20? São muitos e requerem profunda reflexão. Por isso, a Conferência Ethos 2012 vai discutir "A empresa e a nova economia - o que muda com a Rio+20", entre os dias 11 e 13 de junho, em São Paulo. Serão analisados em profundidade os temas que vão ser objetos de negociação na Rio+20.
As discussões vão desenhar cenários para verificar o impacto do que poderá ser decidido - e também do que não for decidido - no mercado e na vida das pessoas. Haverá também o aprofundamento das reflexões sobre os temas estruturantes da nova economia e o aperfeiçoamento das propostas de mecanismos que ajudem a internalizar as premissas do desenvolvimento sustentável na economia e na política.
Vamos construir um cenário com duas das propostas em discussão. Suponhamos que a Rio+20 aprove a orientação já estabelecida em seu "rascunho zero" oficial (documento que está orientando as discussões da conferência) de "eliminar gradualmente subsídios que exerçam efeitos negativos sobre o meio ambiente". Uma das consequências dessa decisão seria, por exemplo, políticas econômicas totalmente reformuladas, levando em conta os critérios decididos na Rio+20.
No caso brasileiro, o governo não poderia reduzir o IPI dos carros e da linha branca sem exigir contrapartidas que diferenciassem produtos poluentes de não poluentes. E a indústria, para se beneficiar de isenções e outros incentivos fiscais, precisaria investir numa produção mais verde. O cidadão teria à disposição, por exemplo, carros menos poluentes e geladeiras mais eficientes em consumo de energia, a preços menores.
Se a Rio+20 resolvesse se apresentar como a saída para a crise, então poderíamos imaginar uma transformação radical nos negócios e no nosso modo de vida, pois as premissas do desenvolvimento sustentável norteariam as decisões dos governos e das empresas.
Um dos aspectos mais cruéis do nosso modelo insustentável de civilização é a crise financeira atual, que aumenta a cada nova onda e vai levando consigo a confiança no mercado e nas instituições democráticas, os valores que norteiam as relações humanas e os recursos materiais e naturais das sociedades e do planeta.

Paralela à Rio+20, Cúpula dos Povos vai debater causas estruturais da crise ambiental

Causas estruturais da crise ambiental, falsas soluções, a economia verde e as propostas vindas dos povos do mundo inteiro constituem os principais debates da Cúpula dos Povos, que ocorrerá no Rio de Janeiro, paralelamente à Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. Atividades autogestionadas, isto é, livres, marcarão os dias 15 e 16 de junho, precedendo a marcha que abrirá oficialmente, no dia 17, os trabalhos da Cúpula dos Povos. Nos dias 18 e 19 de manhã, continuarão sendo realizadas atividades autogestionadas. À tarde, o Comitê Facilitador da Sociedade Civil para a Rio+20 vai realizar a Assembleia Permanente dos Povos, onde serão discutidos  temas como as causas estruturais da crise ambiental e ecológica e as soluções indicadas pelas Nações Unidas (ONU) para resolver o problema, entre elas a economia verde. O diretor da Associação Brasileira das Organizações Não Governamentais (Abong), Ivo Lesbaupin, disse que tanto a economia verde quanto os créditos de carbono são soluções que "não mexem no fundamental". Ou seja, não alteram o modelo de produção e de consumo atual. Para ele, o programa da ONU sobre economia verde inclui uma série de propostas interessantes, mas que não mexem no essencial. A Abong faz parte do grupo de articulação do Comitê Facilitador da Sociedade Civil para a Rio+20. Um exemplo são os combustíveis fósseis na matriz energética. Outro é a questão da mudança do modelo produtivo e consumista, "a causa principal da destruição da natureza". De acordo com Lesbaupin, a ONU considera que existe um desperdício de certos serviços ambientais que a natureza presta pelo fato de eles não terem preço. A Abong discorda e diz que esse é um caminho para a mercantilização e consequente privatização desses serviços. As ONGs prometem apresentar na assembleia projetos para resolver os problemas na área ecológica. "A ideia é fazer a proposta de uma nova forma de organização econômica, de produção, e continuar vivendo em uma relação harmoniosa com os bens naturais". Serão apresentadas experiências práticas de todo o mundo. Entre elas, o diretor da Abong destacou a economia solidária. Outras são a agroecologia e a produção de alimentos orgânicos, que vêm sendo feitas no Brasil e em outros países sem o uso de agrotóxicos, que mostram que "é produtiva essa atividade, atende às necessidades das populações do entorno e garante alimentos saudáveis". A Assembleia Permanente dos Povos voltará a ocorrer no dia 21 de junho, quando será definida uma programação de lutas e atividades que deverão ter continuidade após a Cúpula dos Povos. O dia 20 será o de Mobilização Global. Nessa data, estão previstas manifestações no Rio de Janeiro e em várias cidades do mundo em torno de projetos que ataquem as causas estruturais da crise, combatam a mercantilização da natureza e defendam os bens comuns. Lesbaupin insistiu que os povos querem uma mudança radical nos modelos de produção e de consumo. "Não se pode mais produzir ilimitadamente, que é a perspectiva atual, porque alguns desses bens não são renováveis e são finitos, como o petróleo". Ele lembrou também o caso da água doce, cuja utilização vem sendo feita em quantidade excessiva, impedindo a capacidade de regeneração desse bem. O diretor disse que o Brasil, que detém 13,7% da água doce do mundo, parece não se preocupar muito com o problema. Outra questão é que 70% da água doce estão sendo usados para a irrigação. Segundo o diretor da Abong, é preciso rever o modelo e escolher técnicas de irrigação relacionadas às necessidades das populações, para poupar esse bem. A Cúpula dos Povos será encerrada um dia após a conferência oficial Rio+20, que se estenderá de 20 a 22 de junho. No dia 23, a cúpula pretende apresentar uma declaração final, com propostas consensuais no que se refere às soluções, "a partir de uma construção coletiva que está sendo feita". (Agência Brasil)

Fórum Mundial da Água começa com alertas sobre escassez de água doce

O Sexto Fórum Mundial da Água foi inaugurado na manhã desta segunda-feira (12) em Marselha, no sul da França.
O Fórum vai contar com a participação de milhares de delegados que discutirão como encontrar soluções para garantir o acesso à água doce em condições sanitárias decentes para todos no mundo. Sob o lema "É hora de soluções", o Fórum, que reúne durante seis dias chefes de Estado e de governo, ministros e representantes de empresas e da sociedade civil de 140 países, foi inaugurado pelo primeiro-ministro francês François Fillon.
Esta reunião sobre a água, realizada a cada três anos, foi aberta com chamados de advertência das Nações Unidas de que a mudança climática e o crescimento demográfico provocaram um aumento da pressão sobre a água, o que obriga a repensar como satisfazer esta galopante demanda do líquido.
Declarando que "os desafios são imensos e os números são tenazes", o chefe de governo francês lembrou que "o número de seres humanos que não têm acesso à água salubre são contabilizados em bilhões". E "o número de mortos a cada ano devido aos riscos sanitários é contado em milhões", acrescentou Fillon. "Esta situação não é aceitável", declarou o primeiro-ministro, que é também titular do ministério de Ecologia da França.
Diferentemente dos Fóruns sobre a água anteriores, o de Marselha promete "soluções concretas" para garantir uma distribuição equitativa da água, cujo direito foi reconhecido pelas Nações Unidas em 2010. A reunião deverá ser concluída com propostas sobre como aliviar a crescente pressão sobre este valioso recurso e como repartir melhor a água potável, já que cerca de 800 milhões de pessoas no mundo não têm acesso a ela.
Entre os líderes mundiais que participarão da reunião em Marselha estão Mohammed VI do Marrocos, o chadiano Idriss Deby e o presidente da Comissão Europeia, José Manuel Barroso, além de cerca de 60 ministros. Além de líderes governamentais, chefes de empresas, associações e organizações não governamentais discutirão o tema da água, esperando chamar a atenção internacional sobre a urgência de gerir melhor os recursos hídricos.
Em Marselha também será realizado um Fórum alternativo, que reunirá centenas de organizações não governamentais. Cerca de dois mil representantes da sociedade civil, provenientes da América Latina, Espanha, Alemanha, Europa, África e Estados Unidos participarão do encontro, que tem início na quarta-feira (14).
Como pano de fundo destas duas reuniões está o alarmante estudo da ONU apresentado nesta segunda-feira, que ressalta que as mudanças climáticas, com suas consequentes secas e inundações, estão agravando a situação da água, ao derreter as geleiras e provocar mudanças nos padrões de chuva, o que impacta seriamente nas fontes de água.
(Jornal do Brasil)

'Governos precisam enfrentar com coragem o problema dos limites do planeta'


Para Sergio Besserman, coordenador da Rio+20 na prefeitura do Rio, falta aos líderes políticos criatividade para criar modelo de expansão econômica sustentável.
O economista Sergio Besserman Vianna é o encarregado, por assim dizer, na Prefeitura do Rio por organizar a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20. Mas ele fala sobre o evento com um conhecimento de causa ainda mais amplo: do pesquisador que vem há anos investigando questões ligadas às mudanças climáticas e aos danos que isso pode trazer às cidades; como militante das causas ambientais e também como colaborador do Ministério do Meio Ambiente e do Itamaraty.
Para ele, não é um erro a Rio+20 não ser uma conferência ambiental, justamente porque o problema que a humanidade enfrenta está intimamente ligado com o modelo econômico que desenvolvemos ao longo dos últimos séculos. "O que temos hoje é uma única questão: como a economia global pode voltar a crescer sem esbarrar nos limites do planeta", diz. Na entrevista a seguir, ele explica por que. 
O que podemos esperar da Rio+20? Os temas que devem ser discutidos parecem ao mesmo tempo tão vagos e tão abrangentes.
Existem duas formas de olhar para a Rio+20. Uma é mais burocrático-formal, vinculada aos acordos no âmbito da Organização das Nações Unidas, das negociações diplomáticas. A outra é olhando para o mandato da Rio+20, que é bem diferente da Rio 92. Não é uma cúpula de chefes de estado, é uma conferência das Nações Unidas, está um degrau abaixo, digamos assim, que quer discutir desenvolvimento sustentável, economia verde e combate à pobreza.
Não é coisa demais?
É um jogo. À primeira vista geraria uma leitura reducionista. Que economia verde é toda inovação tecnológica ou modo de fazer que seja um pouco mais eficiente no uso dos recursos naturais. E combate à pobreza fica parecendo uma coisa do tipo: cuidado com essas coisas relacionadas ao meio ambiente para não atrapalharem o processo de inclusão social. Mas é um movimento em espiral. O tema é exatamente esse: que tipo de economia pode existir que não esbarre nos limites do planeta e consiga dar à civilização uma noção de avanço e progresso na sociabilidade. Que tipo de economia pode existir que não nos leve aos piores cenários de aquecimento global, à extinção de espécies, à acidificação dos oceanos e que mantenha a inclusão social. Esse modelo que está aí não serve, porque esbarra nos limites do planeta. E quem esbarra hoje é 1,5 bilhão de pessoas, mas 5,5 bilhões querem esbarrar. Claramente isso é insustentável. O modelo oferecido não é generalizável.

Mas quando os governos fizeram declarações de que essa não é uma conferência de meio ambiente, é de economia e combate à pobreza, houve reações negativas.
Na verdade a reação de muita gente, inclusive a minha, foi pensar: "Claro! Inclusive nem existe esse problema de meio ambiente." Temos mesmo de discutir a macro-economia global, os preços que nela são praticados, a desigualdade. Repito: nem existe um problema de meio ambiente. Em seus bilhões de anos, ele sempre encontrará formas de se recuperar. A natureza não tem um problema no tempo dela. Essa é a visão do século 20, que colocou conservacionismo de um lado e crescimento econômico de outro. Isso é uma balela. O que temos hoje é uma única questão: como a economia global pode voltar a crescer sem esbarrar nos limites do planeta. 
E o senhor acha que os governantes têm clara essa noção?
O que fica claro é esse jogo. Mas não há ainda maturidade na governança global ou no processo político global. Não existe por trás dele uma massa crítica, muita mais ampla que as ações dos governos, que lhes permita enfrentar com coragem o problema dos limites do planeta. Ele nem sai de cima da mesa, nem é abordado diretamente. Isso gera uma ambiguidade, mas é normal em um processo político.
Qual pode ser o produto da conferência?
É restrito, é uma declaração política. Haverá uma discussão sobre governança global, mas que será reduzida a uma discussão de instâncias internas das Nações Unidas. Se o Pnuma deve ser empoderado, se deve ou não existir o conselho x e y. Quando de novo o que está por trás não é isso, mas a carência de governança global para que as decisões se tornem ação. Não vai discutir o verdadeiro problema, que é: não existe governança no mundo para esse processo de transformação. Quanto à declaração política, a minha visão é que, como isso tudo se trata de um processo político, histórico, de gigantesca profundidade, se sair uma declaração dos chefes de estado que impulsione as negociações climáticas e da biodiversidade, a agenda do desenvolvimento sustentável, vai ajudar. Se for uma declaração pífia, a qual falte coragem para reconhecer a gravidade do momento de crise ecológica, aí não vai ajudar. Mas pode ser que o comício que vá vaiá-la ajude.
Já são 40 anos de discussões e ainda não se avançou muito. O senhor acha que em parte isso pode ter ocorrido porque até então estava se separando a questão ambiental das demais?
Concordo e há dois aspectos nessa pergunta. O primeiro: hoje há uma compreensão de que a dicotomia de colocar o ambiente de um lado e o projeto econômico e social do outro é uma bobagem. E que não há possibilidade de alcançar o desenvolvimento econômico se não encontrarmos uma forma de lidar com os problemas que estamos vivenciando. Simultaneamente, estamos deixando de lado aquela postura infantil de que estamos estragando a natureza do planeta e, por isso, nos cabe ter a responsabilidade ética de salvar a natureza. Não se trata de ciência nova, mas uma evolução do pensamento. São tempos muito diferentes os da humanidade e os da natureza. O nosso se conta em séculos e milhares de anos, e para a natureza isso é um piscar de olhos. Não temos poder nenhum para estragar a natureza, nem temos natureza nenhuma para salvar porque também não temos poder para isso. Nós temos um problema: estamos estragando a natureza do nosso tempo. E nós dependemos dela para ter água, solo, clima, biodiversidade. E a população continua crescendo e há necessidade de inclusão social. Então não se trata de brincar de Deus. Mas se trata de que o desenvolvimento da humanidade, das civilizações, passa por encontrar formas de modificar o atual rumo de insustentabilidade da produção e do consumo. E é muito difícil. Porque pela primeira vez na história a humanidade estará lidando com tomar decisões de longo prazo. Estamos pedindo aos governantes que se elegem olhando para quatro, oito anos no máximo, trazerem para si custos significativos em nome dos filhos dos nossos filhos. E isso tem de ser feito por toda a humanidade. Porque o problema é global.
Mas ainda nem sequer conseguimos resolver problemas locais, de curto prazo, como o das chuvas todo ano...
Verdade. E a gente sabe que deve chover mais, o nível do mar vai subir. Os problemas locais e os globais estão totalmente interconectados. O segundo aspecto é que a situação hoje é outra. Em 92, o que prevalecia era um sentimento, que se revelou falso pouco depois, de que a humanidade havia deixado para trás a época das grandes crises econômicas, de que a sintonia fina dos Bancos Centrais e mais a internet propiciariam uma era de prosperidade contínua, de que os mercados eram capazes de se autorregular. O clima em 92 era de otimismo. Quando o conhecimento científico apresentava que tínhamos um problemão, a reação das autoridades era de que a humanidade seria capaz de enfrentá-los. Hoje sabemos que era um otimismo exagerado, era panglossiano. Hoje a Rio+20 se realiza em um contexto muito distinto. Por um lado temos a crise econômica que começou em 2008, a maior desde 1929, com todos os seus desafios pela frente. Nenhum dos desequilíbrios macro-econômicos globais fundamentais que levaram à crise sequer começaram a ser enfrentados. Por enquanto só estamos patinando de lá para cá. Não é apenas o fato de que a humanidade não foi capaz de realizar nenhuma ação efetiva para enfrentar o problema do clima e da biodiversidade. Também são 20 anos de muito mais pesquisa e ferramentas tecnológicas para conhecer a realidade do planeta, e o quadro que o conhecimento nos apresenta hoje é de uma gravidade muito maior do que aquela que conhecíamos em 92. Não é o apocalipse, mas é muito, muito grave. 
O senhor está otimista?
Vamos guardar o pessimismo para dias melhores.
(O Estado de São Paulo - 11/3)